Depois de muitos milhões de anos, o homem criou coragem e resolveu assumir o comando do mundo e do futuro. Então começaram os sete últimos dias da história...
Na manhã do primeiro dia, o homem resolveu ser livre e belo, bom e feliz. Resolveu não ser mais à imagem de um Deus, mas ser simplesmente homem.
E como devia acreditar em alguma coisa, acreditou em liberdade e felicidade.
Acreditou em bolsa de valores e em progresso, em planejamento e desenvolvimento e, especialmente, em segurança. Sim, a segurança era a base.
Disparou satélites perscrutadores e preparou foguetes carregados de bombas atômicas. E foi a tarde e a manhã do primeiro dia...
No segundo dia dos últimos tempos, morreram os peixes dos rios poluídos pelos desejos industriais... Morreram os peixes do mar pelo vazamento dos grandes petroleiros e pelo depósito do fundo dos oceanos: os depósitos eram radioativos. Morreram os pássaros do céu impregnados de gases venenosos – inversão térmica. Morreram os animais que atravessaram as grandes auto-estradas, envenenadas pelas descargas plúmbeas do trânsito infernal.
Relação consigo mesmoMas morreram também os cachorrinhos de estimação pelo excesso de tinta que avermelharam as lingüiças. E foi a tarde e a manhã do segundo dia...
Relação com Deus
Relação com o outro...No terceiro dia, secaram o capim nos cerrados, a folhagem nas árvores, o musgo nos rochedos e as flores nos jardins. Porque o homem resolveu controlar as estações segundo um plano bem exato. Só que houve um pequeno erro no computador da chuva, e até que descobrissem o defeito, secaram-se os mananciais e os barcos que singravam os rios festivos encalharam nos leitos ressequidos. E foi a tarde e a manhã do terceiro dia...
Relação com o mundo, o universo...
No quarto dia, morreram 4 dos 5 bilhões de homens: uns contaminados por vírus cultivados em provetas eruditas, outros por esquecimento imperdoável de fechar os depósitos bacteriológicos, preparados para a guerra seguinte; outros ainda morreram de fome porque alguém não se lembrava mais onde escondera as chaves dos depósitos de cereais. E amaldiçoaram a Deus: se ele era bom, porque permitia tantos males? E foi a tarde e a manhã do quarto dia...
No quinto dia, os últimos homens resolveram acionar o botão vermelho, porque se sentiam ameaçados. O fogo envolveu o planeta, as montanhas fumegaram, os mares evaporaram. Nas cidades, os esqueletos de concreto armado ficaram sujos, lançando fumaça das órbitas abertas. E os anjos do céu assistiram espantados como o planeta azul tomou a cor do fogo, depois cobriu-se de um marrom sujo e, finalmente, ficou cor de cinza. Eles interromperam os seus cantos durante dez minutos. E foi a tarde e a manhã do quinto dia...
No sexto dia, apagou-se a luz: poeira e cinza encobriram o sol, a luz e as estrelas... E a última barata que tinha escapado num abrigo anti-atômico morreu pelo excesso de calor. E foi a tarde e a manhã do sexto dia...
No sétimo dia, havia sossego, até que enfim! A terra estava informe e vazia, as trevas cobriam o abismo e o espírito do homem, o fantasma -do homem pairava sobre o caos.
Mas no fundo do inferno comentava-se a história fascinante do homem que assumira o comando do mundo... e gargalhadas estrondosas ecoaram até ao coro dos anjos.